sábado, 9 de agosto de 2008

"Não te movas", Margaret Mazzantini


Não te movas foi o segundo romance de Margaret Mazzantini e ganhou um dos mais conceituados prémios literários em Itália, o Strega. A escritora, nascida em Dublin, tinha já lançado Il Cantino di Zinco e outros textos para serem encenados e que entretanto têm sido levados à cena nos mais diversos países.

Este livro é uma história de muitas histórias, de esperança e amor mas também de desespero e mesmo morte. Toda a narrativa é feita na voz de um pai angustiado, que, sentado num banco de hospital, enquanto vê a sua filha, Ângela, ser operada ao cérebro, desvenda um segredo que guarda há 15 anos.

Sou o teu pai mas sou um homem.E fui um homem lívido e bárbaro que violou uma mulher, uma menina apenas um pouco envelhecida. Fi-lo porque a amei logo e não a queria amar. Fi-lo para a matar e queria salvá-la. Ao esfregar os olhos para empurrar para trás aquela imagem de mim próprio vejo um homem,um dorso de cio que se aproxima de ti. E agora agarro-o pela nuca e digo-lhe: cuidado contigo,essa aí é a Ângela o branco da minha vida…

Conceituado cirurgião leva, aparentemente uma vida perfeita. Mulher fabulosa, casa perfeita, amigos bonitos. O peso da perfeição é tão difícil de carregar e é essa dificuldade que o faz apaixonar-se por uma prostituta num ambiente decadente que é no fundo, o local onde ele não tem que ser perfeito, pode apenas, ser quem é.

15 anos depois desse caso acabado - o segredo e a culpa a consumirem-no devagar - acaba por revelar toda a história à sua filha, ainda que por palavras que não serão ouvidas. Quase uma expiação dos seus pecados.

Será que era mesmo a ti que eu amava? Ou era mais um amor que exigi ao destino? Que ainda exijo. Voltarei a ir passear pelo mundo e pouco importa se a saudade fará tremer o meu coração como um dente numa gengiva encolhida. Todos têm um passado esquecido a dançar atrás das costas. Agora, olho para ti e sei o que é que me estás a tentar ensinar. Estás a ensinar-me que os pecados se pagam. Talvez não valha para todos mas vale para nós.

Com uma narrativa pungente, a escrita de Margaret Mazzantini prende o leitor nesta história deste médico frio e conceituado que não passa de um homem, naquele momento, um pai desesperado que vê a vida da sua filha nas mãos de um outro cirurgião que abdicou do descanso para a operar. Faria ele o mesmo se a situação fosse inversa?

São diversos os temas que cruzam este livro mas sobretudo a ideia de que os segredos podem ser muitas vezes pesados demais para esconder, bem como a perfeição.
Gosto particularmente da passagem em que este homem, pai, negro de segredos, olha a sua filha como o branco da sua vida. Imagem tão simples mas tão esclarecedora.

2 comentários:

Reflexos disse...

Olá,

Gostei do blogue.
O programa não chega ao continente... tentem passá-lo na RTP2 ou na RTPN... porque não como apontamento do programa da Paula Moura Pinheiro?
Eu não vi o programa, ok...

PL disse...

Olá reflexos,

Obrigada pela mensagem mas por enquanto o No fio das palavras tem transmissão apenas na RTP-Madeira. De qualquer forma pode sempre acompanhar o conteúdo aqui no blog!

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