domingo, 25 de janeiro de 2009

"Gente de Dublin", James Joyce

Este pequeno livro de contos de um dos mais conceituados escritores da literatura internacional é incrivelmente fácil de ler. Acho que muitas vezes deixamos de lado os clássicos e os escritores de renome por acharmos que serão demasiado densos, difíceis mesmo de ler. É um preconceito que temos que ultrapassar. Este é um bom livro para dar esse primeiro passo.

Nestes contos Joyce fala da sua cidade natal, Dublin, reflectindo o apego à terra que tanto sentiu. Apresar de ter saído de Dublin rumo a Paris e de ter vivido muitos anos fora da Irlanda, a verdade é que a sua escrita reflectia a saudade da terra.

Nos vários contos os personagens lidam, de uma forma ou de outra, com esse apego à cidade, como logo no primeiro: Eveline.

Encontrava-se em pé no meio duma grande balbúrdia, na Estação de North Wall. Frank acenou-lhe com a mão e Eveline percebeu que falava com ela acerca da passagem. A estação regurgitava de soldados, com malas castanhas. Pelas largas portas da plataforma entrevia-se o barco, uma vasta massa escura com as vigias iluminadas. Eveline nada respondeu. Sentia-se fria, pálida e aflita, e só pedia a Deus que a dirigisse, que lhe mostrasse qual o caminho a seguir, qual o seu dever. O barco lançou um longo e estridente apito no nevoeiro.

James Joyce escreve a cidade tal como a via. E se por um lado há um apego, por outro existe uma rejeição relativamente aos valores. O próprio disse que: A minha intenção era escrever um capítulo da história moral do meu país e escolhi Dublin como cenário porque a cidade se me afigura como o centro da paralisia. Tentei apresentá-la ao público indiferente sob quatro dos seus aspectos: a infância, a adolescência, a maturidade e a vida pública.Cheguei à conclusão de que não consigo escrever sem ofender as pessoas.


domingo, 18 de janeiro de 2009

"A Eternidade e o Desejo", Inês Pedrosa

Este é um livro escrito a várias vozes: Clara e Sebastião intercalam os seus discursos com os pensamentos do Padre António Vieira. Pensamentos que ainda hoje são actuais e que ainda hoje chamam o leitor para uma reflexão.

A história de Clara conta-se em poucas palavras mas só no fim a saberemos ao pormenor. Ao longo do livro vamos acompanhando o amor de Sebastião por Clara que o leva a acompanhá-la sem resistências por vezes tendo que lidar com a quase crueldade com que ela o trata. É para não criar falsas ilusões como a própria diz. Porque no amor muitas vezes acabamos por ser levados pela ilusão e Clara não quer que isso volte a acontecer consigo.

Clara não vê e embarca com Sebastião para o Brasil e juntam-se a um grupo que se propõe redescobrir a rota feita pelo Padre António Vieira.

Clara usa Vieira como mapa para encontrar o seu caminho. Sebastião ama-a, tenta seduzi-la, ele que nunca teve que seduzir ninguém. Ela foge de alguém com quem "partilha demasiadas afinidades para conseguirem ser amantes". No "Portugalinho do cá vamos andando" sente-se incompleta. No Brasil, "terra com odor de sobrevivência", sente-se aceite. Foge da "pena contínua que os amigos portugueses tinham dela."

Um livro que é também uma lição, de amor e de vida.



domingo, 11 de janeiro de 2009

"Sou um escritor frustrado", José Angel Mañas

Este é um pequeno livro que pode ser lido num final de tarde. Uma narrativa acelerada que leva o leitor a embarcar numa história quase mirabolante mas que podia perfeitamente acontecer. Seguimos os passos de J. um professor universitário e conceituado crítico literário mas que nunca conseguiu escrever qualquer romance. Vivendo uma vida frustrada, vendo os seus rivais a escreverem bestsellers J. começa a sentir que a sua vida está a caminhar para o abismo.

Sou um escritor frustrado e esta circunstância determinou em grande parte as minhas difíceis relações com o mundo exterior. Se tivesse podido satisfazer a minha paixão pela escrita, não estaria agora onde estou.

Tudo muda quando aceita dar uma vista de olhos num manuscrito de uma sua aluna, a jovem Marian. Apesar de reticente, resolve ler o livro descobrindo que tem um brilhante romance entre mãos. A ganância fala mais alto e acaba por enrolar a jovem, respondendo de forma grosseira que o livro era demasiado amador, mal escrito mesmo. Mas todo o plano fica mais difícil de esconder quando J. publica o seu livro que é de facto o livro de Marian.
O que fazer? Nada mais lógico lhe ocorre do que sequestrar a jovem, deixando-a em cativeiro para que não possa denunciá-lo. Mas todos os planos têm falhas e este não é excepção.

Sem me dar conta, tinha posto em marcha um processo difícil de parar. As edições do romance seguiam-se umas atrás das outras. O processo foi tão vertiginoso que se fizeram importantes estudos sociológicos sobre o fenómeno. No entanto, muito depressa toda aquela engrenagem se voltou contra mim e começaram as pressões para que escevesse mais.

Mas como escrever mais se nem o primeiro tinha sido seu?
Este é um pequeno livro da colecção Pequenos Prazeres da editora Asa que faz um preço de editor muito acessíveL: 2,50€. A prova de que a boa leitura não tem necessariamente que ser cara.

domingo, 4 de janeiro de 2009

"A última lição", Noelle Chatelet

Prepare-se porque esta é uma história real que pode ser dura de se ler.
Mireille, aos 92 anos, plena das suas capacidades mentais, decide que chegou ao fim de um ciclo que quer terminar: a vida.
Um dia, reune os seus quatro filhos e comunica-lhes a sua decisão estabelecendo um dia exacto. Este livro, escrito por uma das suas filhas é o relato desse decisão ao longo dos dias que antecedem o seu último acto.
Concordaste que a existência de uma data precisa contribuiria para aumentar a violência do teu gesto. Foi-te pedido que a data não fosse marcada. De acordo. Já não seria a 17 de Outubro, mas noutra data. Brevemente. Muito brevemente. Uma vã esperança atravessou-me a alma, irrealista como todas as esperanças: seria brevemente, muito brevemente, de certeza, já não naquela data.
À medida que vamos avançando na leitura vamo-nos apercebendo de quão difícil seria lidar com uma situação que teríamos que ser nós a decidir o fim. O que dizer? O que fazer?
Comecei a imaginar a tua última visita. Tudo: os gestos, as palavras. Os olhares. A porta que se abre. A porta que se volta a fechar. A minha chegada, a minha partida, as palavras que era preciso pronunciar. Como dizer? O que dizer? As últimas palavras. Quais seriam as últimas palavras e o último beijo? Onde, quando e como, o último beijo?
Mais do que uma história de morte esta é uma história de vida., um hino à felicidade.
Mireille Jospin era mãe do antigo Primeiro-ministro francês, Lionel Jospin e mãe da escritora Noelle Châtelet.

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